sexta-feira, 17 de maio de 2013

Efeito borboleta

Já é conhecimento de todos que não temo a dor, a morte e o sofrimento (nessa ordem). Também nunca tive medo de assalto, acidente de avião, envenenamento por gás-mostarda, pia entupida, mordida de tubarão ou ataque de rottweiler. Por isso vai parecer estranho o que tenho a dizer. Mas devo admitir que há uma única coisa capaz de  me causar certo temor neste mundo. Ou melhor, uma única criatura.

Na verdade, não se trata de medo, e sim um misto de cautela com instinto de sobrevivência. Pois quando se está frente a frente com esse animal, qualquer deslize pode significar uma morte dolorosa e um cadáver em um estado em que nem os corvos iriam querer bicar.

Trata-se de um dos seres mais abomináveis e sórdidos que existem na natureza. Com terríveis asas de couro, trazem a calamidade dos céus. Não, não falo de pterodátilos. Me refiro a outro mamífero voador.

Borboletas! Isso mesmo! Não se deixem enganar por sua pretensa fragilidade e aparência inofensiva. É justamente aí que mora o perigo. É essa a imagem que elas querem vender, de um ser pacífico e inocente, um mero disfarce para camuflar sua real natureza criminosa.

Borboletas não se valem de garras e presas como outros animais bestiais, mas sim de artifícios maléficos e meios ardilosos para propagar o caos e a destruição. São bichos demoníacos, moldados pela seleção natural para serem assassinos impiedosos.

Para compensar a ausência de mecanismos físicos de defesa, ao longo das eras as borboletas foram desenvolvendo uma mente astuta para enfrentar seus predadores naturais, como sapos, gafanhotos e fiscais da Receita Federal. Mas com o tempo o que era uma necessidade de sobrevivência despertou nessas diminutas harpias satânicas uma sede de sangue incontrolável. Aos poucos, começaram a se tornar crueis. E gostaram disso...

Maquinando métodos cada vez mais eficazes para se proteger de seus inimigos, foram se tornando mais agressivas e impiedosas. Vejam bem, borboletas não caçam para sobreviver, se alimentam apenas do pólen das flores, de lasanha congelada e tofu. Por isso precisavam encontrar uma forma de dar vazão a esses impulsos assassinos, e assim desenvolveram um comportamento sádico e uma tendência irrefreável à violência gratuita, operando planos cruéis, espalhando a dor, o sofrimento e a cólera por pura diversão.

Muitos céticos agora estarão revirando os olhos em descrença, mas apenas porque se deixam levar pelas aparências. Um pitbull, um tigre de bengala ou um dromedário, por exemplo, apresentam características que os tornam explicitamente ameaçadores: estão sempre com a barba mal feita, de óculos escuros e vestindo jaquetas de couro, passando uma imagem de maloqueiros. Contudo, diante desses animais você já sabe o que esperar. O perigo mora justamente no desconhecido. E as borboletas são mestres na arte da dissimulação e do engodo, são capazes de fazer o mais vil gênio do crime parecer tão perigoso quanto um bebê em uma incubadora.

Claro, ninguém nunca ouviu falar de um caso em que uma borboleta se arrastou para fora de um beco escuro e estraçalhou um adulto de médio porte, mas eu não ligo para estatísticas. Até porque esse animal sórdido, dotado de uma mente fria e traiçoeira, jamais se deixaria ser pego tão facilmente.

Alguém já parou para pensar em quantos acidentes de carro devem ter sido provocados por borboletas e nunca provados? Ela entra pela janela e fica se debatendo na frente do motorista até ele perder a direção. Escapa, então, pelo vidro e vai sugar o néctar de alguma flor, triunfante, enquanto o automóvel arde em chamas no fundo de um fiorde.



(Mais uma vítima de um ataque implacável de borboletas. Crédito: um índio de bobeira)







Devo então citar a famosa frase: o bater de asas de uma borboleta pode causar um furacão do outro lado do planeta. Aí está! O criador dessa máxima obviamente estava tentando alertar o mundo sobre os perigos que esses demônios multicolores representam à humanidade. Com certeza o coitado pagou por isso com a vida, numa queima de arquivo à moda de traficantes de drogas, só que com muito mais requintes de crueldade e piadas ofensivas sobre a mãe da vítima (borboletas adoram humilhar e xingar a mãe). As borboletas não perdoam aqueles que tentam expor seu reinado invisível de terror.

Sim, elas vivem num mundo paralelo, tramando nas sombras, interferindo nos rumos da sociedade, mudando o curso da História, manobrando golpes de estado, derrubando dinastias, afundando embarcações no estreito de Gibraltar, disseminando a peste, a fome e a miséria, criando perfis fake no Facebook para espalhar mentiras e semear a discórdia.

Garanto que se o mundo abrisse os olhos para essa verdade incontestável muitas coisas passariam a fazer sentido. Vejam bem, conduzindo investigações sob esse novo escopo, muitos crimes não resolvidos poderiam finalmente ser solucionados.

Não me surpreenderia encontrar indícios da participação de borboletas, por exemplo, no famigerado Incidente Dyatlov. Para quem não sabe, vou contar do que se trata: nove alpinistas morreram nos montes Urais, na Rússia, em 1959, em circunstâncias que permanecem até hoje sem explicação. Segundo as investigações da época, alguma coisa fez os esquiadores rasgarem suas barracas de dentro para fora e fugirem desesperadamente sob forte nevasca. Os corpos foram encontrados dias depois. Duas vítimas tiveram o crânio esmagado, duas tiveram costelas partidas e outra estava sem a língua. Apesar disso, não havia sinais de luta e nem ferimentos externos. Autoridades atribuíram as mortes a uma "força incontrolável desconhecida". Restam apenas especulações sobre o que pode ter acontecido naquela fatídica expedição.

Percebem a trama? Que outra criatura seria capaz de causar um dano tão grande sem deixar vestígios? Um urso jamais fugiria sem deixar pegadas na neve ou galhos retorcidos; tribos selvagens também não teriam conseguido apagar todas as marcas. Nem mesmo alienígenas, que também entraram na lista de prováveis suspeitos, teriam tamanha frieza, sem contar que todos sabem que alienígenas preferem muito mais circular por Nova York, ou alguém em sã consciência realmente acha que eles iriam preferir ficar congelando o saco num frio de -30ºC no meio do fim do mundo quando poderiam estar batendo um dogão no Central Park ou tirando onda na Times Square?




(Aliens dão um rolê pelo Central Park. Crédito: Ellen Ripley) 



Eu estive envolvido no caso, e levantei a ideia, à época, que deveríamos procurar por colônias de borboletas nas redondezas. Obviamente fui chacoteado e terminei afastado do serviço, pois julgaram que eu estava começando a ter alucinações devido ao estresse. Admito, a versão que dei para o sumiço do bolo da geladeira da companhia uma outra vez havia sido meio fantasiosa, mas daquela vez eu estava falando sério.

Falar a verdade, contudo, tem seu preço. Alguém de dentro me dedurou, e, quando descobriram que eu sabia sobre sua real natureza, as borboletas passaram a me ver como uma ameaça, e desde então elas tentam me eliminar. Outro dia eu andava tranquilamente pela rua quando um andaime despencou sobre mim, mas por pouco desviei. Pude ver, ao longe, um par de asas flapeando para longe dali.

Portanto, da próxima vez que você ver uma borboleta, pense duas vezes antes de deixá-la pousar no seu ombro para dar sorte, pois você poderá morrer para sempre (Ou até sua família realizar um ritual satânico para ressuscitá-lo, mas aí você terá que aguentar a encheção de saco do seu pai dizendo como você só dá trabalho e não ajuda nos afazeres da casa, e você não ia querer isso, não é?).

Enfim, cuidado com borboletas. E tobogãs. Nunca confie em tobogãs, esses trapaceiros.

... Espere, que barulho foi esse?

Leia mais!
A trilogia de Braddock Lewis: Braddock Begins; Braddock Rises; Braddock Crusoé
Futebol, esporte Maldito (Ou: Pelo fim do pênalti)



10 comentários:

Robespierre disse...

Morte aos jacobinos!

Danton disse...

Ei, Robespierre. Você é um jacobino!

Robespierre disse...

Ops. Morte aos girondinos!

Danton disse...

Agora sim.

Arthur Virgílio disse...

Certa vez presenciei um assalto a banco por uma borboleta extremamente truculenta.

Espero que, um dia, esses seres insanos venham a ter o fim que merecem!

Zé da Fita disse...

Meu tempo na lan house está acaband.... merda! acabou!

Biólogo da Puta Que Pariu disse...

O senhor tem toda razão em temer borboletas, senhor Braddock.

Mas não se preocupe, aqui no Instituto Butantã já estamos produzindo soro contra picada de borboleta.

Pé Grande disse...

Puts, nem me lembre desse caso. Fui injustamente acusado e perseguido após a morte daqueles esquiadores. Expliquei para a polícia que eu colei lá no acampamento, nós tomamos uns goró, acendemos uma ervinha de leve e depois fui embora. O que aconteceu depois com aqueles pobres coitados não tenho ideia, mas digo que alguém armou para me incriminar. Claro, vamos botas a culpa no monstro só porque ele possui garras afiadíssimas, presas pontiagudas e come carne humana. Agora que o senhor falou, lembro de ter visto algumas borboletas pelas redondezas aquele dia portando machados, uma clava e uma serra elétrica...

Inimigo Mortal de Braddock Lewis disse...

Querida caixa secreta de anotações...

Hoje descobri o ponto fraco do pentelho do Braddock Lewis.

Borboletas. Isso mesmo!

Fiz uma aliança com o líder das borboletas para destruir aquele miserável para sempre.

Será nesta terça-feira, às oito da noite, na pracinha, quando Braddock estiver voltando de sua tradicional pelada.

Ele não perde por esperar...

Fim da mensagem.

BraddockLewis disse...

Rá, essa não é sua caixa secreta de anotações e agora descobri seu plano. Pode preparar a armadilha que quiser, pois eu passarei longe da pracinha, irei pelo parque, pela trilha central, de modo que você não saberá por onde voltarei da pelada.